A usucapião é um dos caminhos para regularizar a posse de um imóvel e transformá-lo em propriedade, mas esse processo envolve requisitos e particularidades que muitas vezes passam despercebidos ou são alvo de interpretações equivocadas. O Provimento 65 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) trouxe a possibilidade de realizar a usucapião extrajudicial, tornando o procedimento mais ágil em certos casos. Ainda assim, diversos mitos circulam, e é essencial entender o que realmente é necessário para evitar problemas futuros e garantir que o processo de usucapião seja feito de forma correta e segura.
Neste artigo, vamos esclarecer alguns dos mitos mais comuns sobre a usucapião para ajudar você a tomar decisões informadas.
1. O Cartório de Registro de Imóveis ou o Tabelião de Notas decide se a usucapião poderá ser extrajudicial
- Mito: De acordo com o artigo 2º, § 2º do Provimento 65 do CNJ, o interessado tem a opção de escolher entre a via judicial ou extrajudicial para a usucapião, conforme a situação e as especificidades do imóvel. Em outras palavras, a decisão de optar pelo processo extrajudicial é de livre escolha do requerente, desde que sejam atendidos os requisitos exigidos.
Na via judicial, o processo de usucapião geralmente é mais demorado, podendo levar anos para ser concluído. Entretanto, existe a possibilidade de solicitar a gratuidade de justiça, o que pode reduzir os custos processuais para aqueles que têm direito a esse benefício. Já na via extrajudicial, o custo costuma ser mais elevado, considerando as despesas com cartório e de profissionais envolvidos. Porém, essa opção tende a ser mais rápida, permitindo, em certos casos, a conclusão do processo em poucos meses.
2. Toda usucapião extrajudicial exige planta e memorial descritivo do imóvel
- Mito: O artigo 4º, § 5º do Provimento 65 do CNJ dispensa a apresentação da planta e do memorial descritivo em alguns casos específicos, como quando o imóvel usucapiendo é uma unidade autônoma de condomínio edilício ou loteamento regularmente instituído. Basta, nesses casos, que o requerimento inclua uma descrição conforme a matrícula.
Além disso, segundo o artigo 10, § 10, do Provimento 65, se o imóvel já possui matrícula com descrição precisa e houver identidade perfeita entre a descrição e a área objeto da usucapião extrajudicial, a intimação dos confrontantes é dispensada. O registro da aquisição originária pode ser feito na matrícula existente, o que facilita o procedimento.
3. Iniciado o processo judicial, não é possível iniciar o procedimento extrajudicial
- Mito: É possível, a qualquer momento, solicitar a suspensão do processo judicial por até trinta dias ou até mesmo optar pela desistência dessa via para promover a usucapião extrajudicial, conforme disposto no artigo 2º, § 2º do Provimento 65 do CNJ.
Muitas pessoas acreditam que, ao iniciar um processo judicial de usucapião, ficam impossibilitadas de optar pela via extrajudicial caso o procedimento trave ou se torne demorado. Na verdade, é possível solicitar a suspensão do processo judicial e migrar para a usucapião extrajudicial. Essa alternativa pode ser viável para acelerar a regularização, aproveitando as provas já produzidas, caso o processo judicial se mostre menos ágil.
4. Somente imóveis com matrícula podem ser usucapidos pela via extrajudicial
- Mito: O artigo 4º, inciso I, alínea “a” do Provimento 65 esclarece que a descrição do imóvel pode constar na matrícula em caso de imóvel individualizado, ou da área total para imóveis não individualizados, possibilitando a usucapião extrajudicial mesmo para imóveis que ainda não possuem matrícula.
Outro mito comum é o de que imóveis sem matrícula são terras devolutas, portatanto não podem ser usucapidos. No entanto, isso não é verdade. A descrição do imóvel a ser usucapido pode ser realizada por meio de planta, memorial descritivo, endereço e outras informações que identifiquem a área. Mesmo sem matrícula prévia, é possível promover o reconhecimento de posse por usucapião, conforme previsto no artigo 4º do Provimento 65 do CNJ.
5. Não é possível realizar usucapião extrajudicial de múltiplos imóveis em um único processo
- Mito: O artigo 4º, § 10 do Provimento 65 prevê que se o pedido de usucapião extrajudicial abranger mais de um imóvel contíguo, ainda que com diferentes titulares, o processo pode ser feito por meio de um único requerimento e ata notarial, o que torna o procedimento mais econômico e célere.
É possível usucapir mais de um imóvel em um único processo, desde que sejam contíguos, ou seja, imóveis que estejam lado a lado e sem qualquer separação física. Esse é o caso, por exemplo, de dois terrenos utilizados como um só, mas com duas matrículas. No entanto, se houver uma rua ou outra separação no meio dos imóveis, a usucapião conjunta já não será permitida, conforme o §10 do artigo 4º do Provimento 65 do CNJ.
6. A assinatura dos confrontantes deve ser feita na planta e no memorial descritivo
- Mito: O artigo 10, §§ 7º e 8º do Provimento 65 dispõe que o consentimento dos confrontantes pode ser manifestado a qualquer momento, seja por documento particular com firma reconhecida, instrumento público, ou diretamente no cartório ao oficial responsável pela intimação. Esse consentimento também dispensa a presença de um advogado ou defensor público.
7. Imóveis com matrícula exigem assinatura dos titulares de direitos para usucapião extrajudicial
- Mito: Conforme o artigo 10, caput, do Provimento 65, se não houver as assinaturas dos titulares dos direitos registrados, esses serão notificados pelo Oficial de Registro de Imóveis para manifestarem seu consentimento em até 15 dias. A ausência de resposta será interpretada como concordância.
8. Não é possível notificar confrontantes por edital
- Mito: Nos casos em que os notificandos estejam em local incerto, não sabido ou inacessível, o artigo 11 do Provimento 65 do CNJ permite que o oficial de registro promova a notificação por edital, publicado em jornal de grande circulação por duas vezes consecutivas, considerando o silêncio como concordância. Costuma ser muito comum o caso de terrenos baldios de imóveis sem matrícula, que fica difícil localizar os possíveis titulares dos direitos.
9. A usucapião é um meio para evitar o pagamento de impostos e multas
- Mito: A usucapião não deve ser usada como forma de burlar impostos ou obrigações tributárias. O artigo 13, § 2º do Provimento 65 do CNJ exige que se justifique o obstáculo à correta escrituração das transações, justamente para evitar que a usucapião seja usada para sonegação de impostos. O registrador deve alertar o requerente e testemunhas de que a declaração falsa caracteriza crime de falsidade.
Outro mito comum é que a usucapião pode ser usada para evitar o pagamento de impostos, como o ITBI ou o ITCMD, ou para escapar de multas por não abrir inventário no prazo. Na realidade, essa prática é considerada fraude e viola os requisitos legais. A usucapião deve ser vista como uma última alternativa para regularizar um imóvel, e não como uma maneira de driblar tributos ou obrigações legais. Inclusive, é necessário justificar o motivo pelo qual não foram realizados atos prévios, como abertura de inventário ou escritura de compra e venda, explicando por que essas opções não são mais possíveis.
Se você acredita que pode ter direito à usucapião e quer entender suas possibilidades, entre em contato com o nosso escritório no botão abaixo.